sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Caminhadas-Planeamento e dicas parte 2

Com este artigo venho enquadrar pormenores mais técnicos e especializados para quem deseja levar as caminhadas a um nível mais desafiador, e como tal requer cuidados, experiência e técnicas específicas. Sendo as caminhadas um desporto que abrange diversos níveis de andamento, estas podem divergir desde um simples percurso plano a um percurso montanhoso de alto desnível, e como tal existem sempre técnicas a adoptar para superar diversos obstáculos.

Os obstáculos mais comuns de se encontrar numa caminhada estão muitas vezes associados ao terreno em si, nomeadamente ao seu desnível. Consoante a subir ou a descer em diversos graus de inclinação, existem diversas técnicas que podemos utilizar para facilitar o nosso percurso:

Subidas- Provavelmente o grande desafio por muitos caminhantes, as subidas apresentam-se normalmente como um desafio mais físico que técnico. Contudo, o uso das técnicas correctas de caminhada durante a subida, permite o uso de um menor esforço tornando o mesmo mais eficiente. As caminhadas são principalmente um exercício aeróbico, podendo existir conforme o ritmo ou intensidade de subida e descidas algum esforço anaeróbio láctico. Neste último existe a produção de ácido láctico e como tal limita as capacidades do caminhante durante esse período.
Nas subidas de alta inclinação existe a necessidade de um grande esforço muscular por parte das pernas de forma a vencer a gravidade e nesse sentido, tal esforço pode ser diminuído com uma respiração regular, constante e profunda. Uma respiração lenta e profunda diminui o ritmo cardíaco e reduz a sensação de esforço. Para progressão no terreno passos largos são os ideias pois aumentam a distância percorrida sem aumentarem necessariamente o ritmo da caminhada.  É de se evitar contudo ritmos demasiado lentos. Um ritmo ligeiramente acelerado diminui o esforço da subida assim como a sua duração, isto deve-se ao momento linear ajudar na progressão do caminhante contra a gravidade, implicando por isso menos esforço por parte das pernas. Em zonas extremamente inclinadas pequenos impulsos são o ideal para serem transpostas, o mesmo aplica-se em zonas de pouca aderência como terreno de pedras soltas. O posicionamento correcto dos pés ajuda neste aspecto. Ao colocar-se o peso do corpo primeiro  sobre o calcanhar e transferi-lo progressivamente para a ponta irá fornecer muito mais aderência e tracção. É importante manter os pés paralelos à direcção da subida de forma a cada passo resulta de uma superfície maior de tracção.

O uso de um bastão de caminhada ajuda tanto como forma extra de impulso como de tracção em zonas pouco aderentes, sendo por isso recomendado em subidas longas para diminuir o esforço.




Descidas-As descidas podem ser consideradas tanto ou mais desafiadoras que as subidas por representar um desafio muito mais técnico e podendo ser igualmente fisicamente exigentes. A descer costuma-se dizer que "todos os santos ajudam", contudo apesar da gravidade diminuir a dificuldade de progressão, esta implica um esforço para manter uma progressão controlada. O grande desafio das descidas consiste em saber tirar partida da "ajuda" da gravidade conseguindo manter um controlo da sua progressão.

É impossível lutar contra a gravidade, desse modo tentar travá-la apenas poderá implicar quedas e esforços em vão. Desde descidas ligeiras a moderadamente acentuadas devemos dar passos largos, aproveitando o balanço da gravidade de forma a ganharmos momento linear e progredirmos fluídamente. Ao fazermos isto vamos progredir com alguma velocidade, o que por si implica um olhar mais distante do caminho a percorrer de forma a escolher as trajectórias a tempo sem ser necessário travar. É ideal ter em conta os obstáculos que poderão surgir no terreno como pedras soltas, raízes e regos e escolher um percurso de forma a contorná-los.
Quando for necessário travar ou diminuir a velocidade de progressão ao atravessar zonas mais íngremes deve-se colocar os pés de lado, ou seja perpendicularmente à direcção da descida, de forma a realizar-se uma derrapagem controlada. Esta técnica é igualmente recomendada em descidas com pouca aderência.
Em descidas bastante inclinadas é importante manter o centro de gravidade o mais baixo possível, podendo inclusive em alguns casos extremos ser necessário "escorregar" sentado de forma a progredir em segurança.  Ao realizar tal técnica deve-se usar as mãos para travar e manter as pernas esticadas de forma a criar atrito suficiente para controlar a velocidade.

Para facilitar em descidas muito inclinadas e com muito pouca aderência, o ideal é utilizar uma corda para descer-se em rappell. Se for este o caso deve-se encontrar um ponto forte para ancoragem e descer com as pernas esticadas contra o declive de forma a afastar o corpo da descida, indo controlando a velocidade de progressão com as mãos na corda.
 
 
 
 
 
Preparação física:
 
Uma boa preparação física ajuda não só a enfrentar os desafios das caminhadas com sucesso, como a desfrutá-las melhor. Sendo o esforço associado às caminhadas maioritariamente aeróbico, treinar a resistência é fundamental para poder-se realizar percursos mais longos e mais desafiantes. Saber um bom ritmo é o essencial, numa caminhada o ideal é de este ser de 5 a 6km/h, o que equivale a um passo constante de ritmo moderado. Apesar de não parecer ser muito rápido, em terreno irregular e acidentado, com subidas e troços inclinados tal velocidade por vezes é difícil de manter, o que por si já requer alguma preparação física.
 
Existem vários exercícios para aumentar a resistência que podem ser realizados tanto em casa, ao ar livre ou num ginásio através de ergómetros (máquinas de exercício cardio), estes devem ser realizados preferencialmente 5 vezes por semana, segue-se em baixo os essenciais:
 
Caminhar- Nada melhor para preparar-se para uma caminhada do que praticar o acto em si. Pequenas caminhadas diárias fazem uma grande diferença na preparação física. Estas podem ter duração desde 20 min até uma hora, e mesmo quando o tempo para as realizar seja pouco, estas podem ser improvisadas substituindo pequenos trajectos diários que normalmente são realizados por outro meio de transportes por ir a pé. Como o pretendido neste treino é trabalhar a resistência é mais importante estas serem de mais longa duração com velocidades lentas do que o oposto. Quem possui cães só o simples facto de realizar passeios mais longos de cerca de meia hora num parque ou campo perto de casa já faz toda a diferença na preparação para uma caminhada.
 
Correr- Correr é levar o caminhar para outro nível. Realizar pequenas corridas de resistência regulares ajuda a subir o limiar de duração de esforço suportado nas caminhadas, pois a longo termo aumenta as cavidades do coração aumentando a quantidades de sangue bombeada, assim como o nível de glóbulos vermelhos responsáveis pelo transporte do oxigénio. É importante contudo que a corrida seja um esforço aeróbico e não anaeróbio, não podendo ser por isso demasiado intensas e sendo obrigatório uma respiração constante e controlada. Uma boa corrida de resistência deve situar-se entre velocidades de 8km/h a 12km/h dependendo da forma física do praticante. Velocidades muito superiores a 12km/h já começam a requisitar um esforço anaeróbio o que por si não é o pretendido. O segredo consiste é aumentar a duração da corrida e progredir não aumentando a velocidade mas sim a duração da corrida e do tempo em que se consegue manter o mesmo ritmo. Praticar corrida numa passadeira ao invés de na rua apresenta vantagens para os iniciantes pois permitem estes controlarem a velocidade e a duração das mesmas. Uma alternativa para as corridas outdoor é utilizar um pedómetro que consegue realizar as mesmas funções de medição da velocidade, distância e tempo.
Muito importante nas corridas e crucial para determinar a velocidade ideal de progressão para um esforço óptimo é saber qual o seu ritmo cardíaco ideal. De forma a existir uma evolução a nível de capacidade aeróbica é necessário que o esforço efectuado implique um ritmo cardíaco de 60 a 80%  do ritmo cardíaco máximo do individuo, tal pode ser calculado através do método de Karyonen que consiste nos seguintes passos:
 
-Calcular o ritmo de cardíaco de repouso de manhã- Tal pode ser calculado ou através de uma cintura peitoral específica para medir pulsações ou realizando uma contagem das mesmas durante um minuto com dois dedos debaixo do maxilar junto às artérias Carótidas. Se utilizar este último método devem ser feitas 3 contagens e fazer uma média das mesmas, ex: (74+76+78):3=76, o resultado é o ritmo cardíaco de repouso. (Esta contagem pode ser feita logo após o acordar ainda deitado na cama e de preferência após um dia de descanso)
 
-Calcular o ritmo cardíaco máximo e o ritmo cardíaco máximo de reserva- Para calcular o ritmo cardíaco máximo teórico basta subtrair 220 menos a idade do individuo, ex: 220-25=195 ou seja uma pessoa de 25 anos tem um ritmo cardíaco máximo teórico de 195 batidas por minuto.
 
Sabendo o ritmo cardíaco máximo teórico pode-se calcular o ritmo cardíaco máximo de reserva subtraindo o primeiro pelo ritmo cardíaco de repouso, ex: (para o mesmo individuo anterior) 195-76=119
 
-Calcular os limites inferiores e superiores do ritmo cardíaco ideal- Estando o ritmo cardíaco ideal inserido entre os 60 a 80% deve-se calcular os valores a 60% e a 80% respectivamente. Tal faz-se por multiplicando os 60% (0.6) ao ritmo cardíaco máximo de reserva (119) e somando ao resultado o ritmo cardíaco de repouso (76). Ex: (119*0.6)+76=147.4
 
Repete-se o processo para os 80% (0.8). Ex: (119*0.8)+76=171.2
 
A frequência cardíaca ideal insere-se entre esses dois resultados, para um cálculo mais preciso pode-se fazer uma média dos mesmos (147.4+171.2):2=159.3 ou então realizar o cálculo anterior a 70% (0.7)
 
Sabendo o ritmo cardíaco ideal podemos então controlar o nosso esforço durante o treino de modo a não ultrapassar esses valores ou ficar aquém dos mesmos. Contudo para uma medição precisa durante o treino é necessário utilizar uma cinta cardíaca e um relógio de medidor de pulsações. Algumas máquinas ergómetros como as passadeiras possuem pegas sensores de pulsação, contudo nem sempre são muito precisas.
 
 
Subir escadas/step/elíptica- Outro exercício ideal para um trabalho aeróbico assim como desenvolvimento dos músculos das pernas é o simples acto de subir e descer escadas. Tal pode ser praticado em qualquer lance de escada ou num pequeno degrau/step subindo e descendo-o múltiplas vezes. A utilização de ergómetros (máquinas de exercício cardio) presentes nos ginásios também simulam bastante bem o movimento, como o caso do step ou a elíptica. Como referido anteriormente a velocidade e as inclinações devem ser adequadas de forma a que o esforço implique um uso do ritmo cardíaco ideal, contudo na elíptica a frequência de rotações por minuto (rpm) deve situar-se entre os 70 a 80, ajustando a inclinação de forma a aumentar ou diminuir a intensidade de esforço.

Remo/natação- O ergómetro do remo também realiza um trabalho aeróbico assim como solicita músculos da região "core" (região de abdominais e lombares) do corpo e inclusive as pernas. Desse modo ajuda na preparação física geral ajudando inclusive nas caminhadas. A natação é um dos melhores exercícios aeróbicos que se pode realizar pois obriga uma respiração controlada e constante para ser realizada eficazmente, ajudando por isso numa sensibilização e desenvolvimento dos músculos respiratórios. Além disso fornece um trabalho equilibrado e bastante completo a nível muscular de todo o corpo. Por todas estas razões são bons exercícios a acrescentar na preparação física para as caminhadas.

Agachamentos/lunges- Um trabalho de força a nível dos membros inferiores apresenta vantagens para as caminhadas pois ajudam a melhorar o desempenho em vertentes mais inclinadas e acidentadas, assim como a prevenir lesões e entorses das articulações respectivas. Os agachamentos são o melhor exercício a ser feito para desenvolvimento dos membros inferiores pois solicita quase todos os músculos dos mesmos. Este pode ser feito com ou sem pesos, sendo importante manter sempre a coluna direita e realizar o movimento como se fosse sentar num banco imaginário, impedindo que os joelhos passem à frente da ponta dos pés.





















Para iniciantes uma boa forma de fazer o movimento correctamente é encostar uma bola insuflável junto à costas (zona torácica) e manter a mesma encostada a uma parede, agachando progressivamente sem deixara  bola cair.
bola

Uma variante deste exercício são as lunges, em que o movimento consiste em dar um passo em frente flexionando a perna até 90º e voltar a posição inicial. Pode ser feito com ou sem pesos e esta variante ajuda a trabalhar os músculos posteriores da coxa (isquiotibiais).
 



















Nos ginásios existe a possibilidade ainda de utilizar a máquina do leg press que consiste no mesmo movimento dos agachamentos mas em posição sentado, permitindo desta forma realizar um movimento mais seguro, ideal para iniciantes.
Este último exercício pode ser complementado com a máquina do leg curl para trabalhar os posteriores da coxa, menos solicitados no último exercício.

Alimentos ideais:

Como em qualquer desporto a escolha correcta dos alimentos ajuda num desempenho mais eficaz do mesmo. No caso das caminhadas, sendo este um desporto de esforço maioritariamente aeróbico, o grupo dos alimentos a não desprezar são os hidratos de carbono fornecedores de energia (ricos em açúcar de absorção lenta). Na preparação de uma longa caminhada, uma refeição rica em hidratos de carbono feita logo antes irá ajudar a fornecer bastantes horas de energia. Se a caminhada for feita logo de manhã um jantar na noite anterior rica em hidratos de carbono irá criar uma reserva de açucares a ser utilizados durante o esforço da caminhada. Bons pratos a preparar para este efeito baseiam-se em boas quantidades de massa (spaghetii e entre outros derivados), acompanhados com legumes, salada e uma fonte de proteínas. No caso do pequeno almoço um bom leite com cereais já proverá o efeito necessário, ainda mais se os cereais forem do tipo integral ou muesli (frutos secos possuem grandes quantidades de açúcar, logo fornecem um grande incremento de energia).
 
Durante a caminhada é importante levar fontes de açucares rápidos para ir repondo pequenas perdas de energia. As frutas são óptimas nesse aspecto, desde maças a tangerinas (ricas em vitamina C fundamental para o exercício) entre outras são boas escolhas para um lanche durante a caminhada. Dependendo da duração é aconselhavél levar um lanche mais reforçado como uma sandes para fornecer calorias necessárias para a continuação do esforço. Barras energéticas poderão ser uma boa escolha, sobretudo em caminhadas muito exigentes e duradouras para fornecer mais um extra de energia, contudo não devem substituir um lanche mais reforçado e completo. Um outro substituto das barras energéticas poderão ser frutos secos como nozes, amendoins, castanhas, passas, cajus, ameixas secas, entre outros.
 
Sendo alimentos todos bastante ricos em açucares tanto de absorção lenta como rápida é bastante importante complementar cada lanche com a quantidade de água necessária. É importante ser água pura sem qualquer suplemento energético, estas bebidas podem ser bebidas após o exercício físico para ajudar na reposição dos sais minerais mas nunca durante o mesmo pois apenas contribuirão para a desidratação .
 
É importante saber gerir os níveis de energia no corpo, em condições de frio ou calor extremos as mesmas acções requerem esforços muito mais significativos. De forma a evitar a exaustão ou perda de forças é importante saber quando é preciso parar para comer ou beber, por pouca que possa parecer a fome ou sede em situações extremas poderão afectar gravemente as nossas capacidades.
 
Como se costuma dizer, mais vale prevenir do que remediar, dessa forma é sempre aconselhável levar mais água e comida caso haja algum imprevisto e a duração da actividade se extenda. Em actividades de aventura é impossível prever a 100% como estas irão decorrer, nesse sentido um aventureiro precavido é um aventureiro inteligente.  Com experiência aprenderão a conhecer melhor o vosso corpo e as vossas necessidades e se tornará mais fácil planear um lanche adequado.
 
Com o conhecimento de técnicas de subida e descida, como preparar-se fisicamente e alimentar-se adequadamente já poderão levar as vossas caminhadas ao próximo nível.
Para o próximo artigo irei abordar o tema da orientação, como ler uma carta militar e de orientação, utilizar um GPS e farei uma introdução ao Geocaching, estejam atentos e boas aventuras !!